Hotel Gaspar (a parte de cima), que também tinha bar e restaurante |
Minha avó materna foi submetida a uma cirurgia
permanecendo internada na Santa Casa por vários dias. Deve ter sido muito
difícil para minha mãe conciliar os papéis de mãe e filha. Lembro-me, ou ouvi o fato por ela contado
tantas vezes que tenho a sensação de lembrança. Não sei como, mas ela conseguiu autorização
para que eu permanecesse com ela durante o dia , contanto que eu não saísse do
quarto. Estávamos hospedadas no Hotel
Rio Preto que ficava na Rua Osvaldo Cruz. Não se admirem da minha memória nem
pensem que estou de caso com o Alzaimer é que durante muitos anos desembrulhei
esta passagem para entender algumas coisas. Como as facilidades que a
burocracia veio nos tirar sem nos dar nada em troca. Como uma creche nos
hospitais para atender casos como os vividos por minha mãe. Depois daqueles
dias, nossa vida em Araçatuba tornou-se quase uma rotina. Se eu estava com dor
de garganta vínhamos para cá se era para comprar roupas ou calçados também.
Meu pai
fez uma sociedade com um primo e compraram o Frigorifico Araçatubense como consequência éramos hospedes constante
do Hotel Gaspar. Enamorei-me de ti
Araçatuba tu és e será sempre minha cidade
preferida . Amo a cidade onde nasci, mas meu coração era tão
pequeninho quando bateu forte por ti, que para sempre eu estaria em ti e tu em mim. Abriguei-me
no teu seio como filha, mas não mamei em tuas fartas tetas, também não esgotei
a seiva que jorrava limpa do Ribeirão Baguaçu, nem poluí as margens do córrego
Machado de Melo, apenas me refresquei em suas margens, como apaixonado que sou
pela natureza. A natureza, minha
senhora, te ornou de beleza rara, mal desfrutada bem sabemos, porque
abandonados estão seus cantinhos e seus canteiros.
Na Praça Rui Barbosa,
curti muitas tardes domingueiras ao som da bossa nova, onde a turminha soltava
a voz acompanhada pelo violão da minha amiga Maria Teresa.
Frequentei teus três
cinemas centrais, tive o prazer de bailar e brindar no Araçatuba Clube, teus
anos dourados.
Passeei por suas ruas
atapetadas por um asfalto uniforme e condizente com teus políticos, que a
amavam tanto quanto teu povo.
Apaixonei-me, também, por teus políticos, com
seus discursos eloqüentes, muitas vezes desprovidos de um português mais culto,
porém, nunca de caráter, controvérsias
haviam, fazem parte de uma boa
administração.
Um
fato é certo minha querida, você ganhava destaque no interior, e até uma
projeção mundial graças ao Frigorifico T. Maia, e foi quando nosso futebol
também ganhou destaque. Cidade linda, não foi atoa que me apaixonei.
Mas tudo passa senhora, teus
amantes morreram, estais agora entregue ao abandono. Onde está seus algozes,
que não viram seu sorriso morrer nas cáries do asfalto? Tuas praças estão com
sarna, perdeu o viço do pelo sadio, seus zeladores desapareceram.
Já não ouço o apito dos
guardas que afugentavam os vândalos. Teus logradouros são criadouros de
mosquito.
Oh minha amada, tenho votado
tão errado! Como tenho te desmerecido! Sofro ao ouvir teu grito de socorro.
Estou desesperada, não sei o que fazer, entendo até esse teu desejo de
desaparecer do mapa, mas não há mal que sempre dure, e tudo passará.
*Emília Goulart dos Santos, escritora, membro da Academia Araçatubense de Letras
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