Rua Treze - Emília Goulart


Ainda há muito da rua Treze de Maio, não basta mudar o nome. Para apagar da memória a alegre triste vida desta rua, levará muito tempo.

As histórias passam de geração a geração. Pedaços daquela rua se espalharam pela cidade e as meninas debruçadas nas janelas da vida, deslumbradas, acreditam que a vida mudou. O falso brilho da mais velha das profissões continua fazendo vitimas. Ninguém aboliu da escravidão às
garotas de programa e fingir prazer fica bem distante da felicidade.

Aquela rua ainda guarda seus fantasmas, ao passar por ela, vêem-se os becos onde a vida era mais sórdida. O grito de socorro era abafado, os carinhos vendidos, a proteção subornada. Quem tem curiosidade e um dia se interessar por ouvir sua história, vai ouvir os lamentos que escapam pelas rachaduras das paredes da rua dos prazeres poucos, e sofrimentos múltiplos revelados vendidos.

O som das guarânias, boleros e tangos que ainda machucam o cotovelo da Rua Quinze de Novembro abrem o arquivo morto da Rua Treze de Maio.

Assim como a rua, nada mudou da vida suada misturada a Cashimir Bouquet, perfume Tabu e muito álcool, a danada vida expulsa da Rua Treze se espalhou pela cidade distribuindo seus ais.

O nome realmente pouco importa, suas casas são velhas lembranças que Araçatuba não quer apagar. O apogeu da agropecuária foi registrado ali sobre os sujos lençóis da poeira que a boiada levantava.

O preço combinado do prazer poderia ser por minutos, mas quase sempre a mulher da vida pagava com a vida.

Ainda há os saudosos que das janelas dos carros, olham para as fechaduras enferrujadas à procura dos prazeres envelhecidos. Outros reviram o lixo, na busca do DNA dos pais. Boiadeiros, era a bola da vez, hoje aos jogadores de futebol, não faltam marias chuteiras.

Uma revelação importante sobre a prostituição eu ouvi certa vez de um delegado já falecido. Havia uma carteirinha e caso a mulher fosse
encontrada duas vezes se prostituindo ela era fixada.

Indignada contestei.

- Então poderia ocorrer de transformarem uma mulher em prostituta independente da vontade dela.

Era lei, acreditavam com esta medida diminuiria a propagação da 
sífilis.

Hoje está tudo muito livre ao ponto de experiência de vida ser confundida com experiência da vida.

Mudaram o nome da Rua Treze de Maio para 15 de Novembro. A prostituta está sem rua, sem rumo e sem destino. O salário é a droga, a Rua Treze continua na mesma, hoje sem um espaço para chamar de seu perambula por toda a cidade. 

*Emília Goulart dos Santos, escritora, membro da Academia Araçatubense de Letras, vários livros publicados.

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